quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Natureza

"O que chamamos de mundo natural não é uma entidade passiva (...)." HARVEY, D. O enigma do capital e as crises do capitalismo. - São Paulo, SP: Boitempo Editorial, 2011 (p.68).
[Pense nisso.]

quinta-feira, 14 de julho de 2011

transnacionais

Estado-nação e empresas globais: territorialidade e transterritorialidade no capitalismo do início do século XXI


Orlando Albani de CARVALHO [1]

O Estado possui na atualidade, assim como antes, um papel central. Mas falar na importância do Estado, de certa forma, contradiz Sousa Santos (2001), para quem o Mercado (como poder e regulação, portanto a maiúscula) superou o Estado no último século. Porém, como salienta Mészáros (2003), 

o sistema do capital não sobreviveria uma única semana sem o forte apoio que recebe do Estado” (p.29) e, apesar do avanço do neoliberalismo – promotor do Estado mínimo e do chamado “Mercado Livre” –  na segunda metade do século XX, “o Estado nacional continuou sendo o arbitro último da tomada de decisão socioeconômica e política abrangente (p.33).

Claramente o problema não está no Estado em si ou na da “globalização econômica”, mas nas políticas que os Estados-Governos realizam.

A questão, desta maneira, não é o poder do Mercado superando o poder do Estado (ou a dialógica entre Estado e mercado), mas o quanto nos últimos 30 anos, o Estado passou a ser cada vez mais um servidor do Mercado. É isso, afinal, o neoliberalismo, que disfarça-se em uma “natural” globalização econômica: um situação onde o Estado, mais que ser “mínimo”, deve dar ao Mercado todas as condições para a realização da lógica capitalista, ou seja, acumular capital para acumular mais capital.  Este Mercado, se concordamos com  Immanuel Wallerstein (2002, 2001), não é e não pode se livre. Em “O fim do mundo como o concebemos”, Wallerstein (2002), ao analisar as relações entre Estado e capitalistas, considera os serviços que o capitalista necessita do Estado.

Quais são os serviços que o capitalista necessita do Estado? O primeiro e maior serviço que exigem é a proteção contra o mercado livre. O mercado livre é inimigo mortal da acumulação do capital. [...] O mercado real nada tem de livre. (p.97)

O problema do “livre mercado” é que em uma condição – hipotética – realmente livre, a concorrência seria enorme ou, nos termos, de Wallerstein, as “entradas” de competidores seriam muito grandes, o que tenderia a minar os monopólios. Os monopólios são o “jardim do éden” dos capitalistas. Evidentemente os capitalistas-empresários estão sempre competindo entre si no mercado. Mas a questão da lucratividade não exige a perpetuação de monopólios: estes podem durar apenas alguns anos ou décadas para produzirem uma acumulação satisfatória. 

De qualquer forma não se deve levar aqui o termo “monopólio” ao pé-da-letra. No sistema capitalista mundial, os monopólios são exercidos por conjuntos de empresas (oligopólios) que admitem a concorrência apenas entre si – é o caso do automóveis e do petróleo – onde qualquer “nova entrada” de um potencial concorrente, caso não se proponha à “jogar o jogo” em termos de eficiência ou nível de preços, é imediatamente submetida às pressões do Estado, aliás, dos Estados, uma vez que o controle sob quem pode ou não estar no Mercado é outra função destes, o que é feito por meio de legislações, subsídios e formação de blocos econômicos que alteram o caráter da competição em favor de determinadas empresas ou setores comerciais.

Apesar da transnacionalidade das empresas ou de sua desterritorialidade ou ainda, no que tange à composição acionária, o próprio capital de uma empresa ser ‘multinacional’, toda empresa tem uma base nacional. A Ford ou a General Motors, podem ter participação de capitais alemães ou japoneses, mas são estadunidenses e  esperam dos Estados Unidos o devido respaldo em questões comerciais.  Investidores, quando compram ações no mercado financeiro, também consideram isso. Isso significa dizer que as empresas, apesar da “globalização”, não deixaram de ter vínculos nacionais, ainda que atuem transnacionalmente.  De acordo com Mészáros (2002, p.229)

Os países capitalistas dominantes sempre defenderam (e continuam a defender) seus interesses econômicos votais como combativas entidades nacionais, apesar de toda a retórica em contrário. Suas companhias mais poderosas estabelecem-se e continuam a funcionar pelo mundo afora; são “multinacionais” apenas no nome. Na verdade, são corporações transnacionais que não se sustentariam por si mesmas.
 
Desta forma, para  Magdoff (1978, p.183 apud Mészáros, 2002, p.229)

É importante ter em mente que praticamente todas as multinacionais são de fato organizações nacionais que funcionam em escala global. Não estamos negando que o capitalismo seja, e sempre foi, desde o inicio, um sistema mundial, nem que tal sistema tenha se tornado mais integrado por ação das multinacionais. Contudo, assim como é essencial compreender e analisar o capitalismo como sistema mundial, é igualmente necessário admitir que cada empresa capitalista se relaciona ao sistema mundial por intermédio do Estado-nação e, em última análise, dele depende.” [o grifo é nosso]

Os Estados são fundamentais para “abrir” mercados – seja por meios políticos, econômicos[2] ou militares – e estabelecer as regras da concorrência (as vezes mesmo de um Estado sobre outro), facilitando ou dificultando as “entradas” de novos concorrentes no mercado. Dito de outro modo: também cabe aos Estados transnacionalizar o Mercado, de forma, é claro, favorável a si – como Estado – e as empresas que nele tem sede.  Neste sentido também deve-se levar em conta as relações de poder que se estabelecem (ou estabeleceram) entre os Estados e que o sistema capitalista moderno é um sistema inter-estatal, que é um campo de relações de poder.[3] Ao final observa-se, neste mecanismo, um aspecto contraditório do sistema, pois, em certas oportunidades, Estados e Mercado, acabam entrando em conflito, apesar de dependentes um do outro.  Nos termos de Mészáros,

uma das contradições (...) mais importantes do sistema se refere à relação entre a tendência globalizante do capital transnacional no domínio econômico e a dominação continuada dos Estados nacionais como estrutura abrangente de comando da ordem estabelecida.” (2003, p.33)

Assim, apesar dos discursos sobre a globalização econômica, onde os Estados devem deixar o caminho livre para a regulação natural do Mercado, devemos considerar que este não é o ultimo degrau da história.  Ellen M. Wood também vê na época atual um paradoxo que envolve a relação entre o Estado-Nação e o Capitalismo. Para esta autora

“o capital foi capaz de estender seu alcance econômico para muito além das fronteiras de qualquer nação-Estado, mas o capitalismo ainda está longe de prescindir da nação-Estado.” (Wood, 2003, p.8)

            Wood (2003) ainda pondera que o capital necessita do Estado como mantenedor da ordem e das garantias das condições de acumulação (p.8), assim, para esta autora, é possível considerar que


“hoje estejamos assistindo aos efeitos de uma contradição crescente entre o alcance global das forças econômicas e as instituições de administração e repressão locais e territoriais de que o capital ainda necessita.” (Wood, 2003, p.8)[o grifo é nosso]

            O capitalismo transterritorial ainda necessita de instituições territoriais como o Estado. É próprio do capitalismo ser global ou transterritorial ou mesmo, como dizem alguns em referencia às empresas transnacionais, ser desterritorializado, isto é, sem apego à territórios, não ser dotado da fixidez dos Estados-Governos, contudo, ainda assim, ele requer ‘marcos regulatórios’ territoriais, pois ele necessita, precisamente, de espaços econômico-políticos diferentes, ou seja, de territórios diferenciados política, econômica e socialmente, para atuar.

Não nos parece que interesse ao capitalismo, e às empresas globais, que o planeta venha a constituir um território único, regido por um mesmo corpo regulatório e, sem dúvida (coisa de menor interesse ainda), socialmente igualitário. Para o Capital, o planeta deve ser exatamente territorializado, deixando para as empresas globais a faculdade da mobilidade transnacional. Assim a organização sócio-política (a estatalidade) deve ser territorial (planetariamente formada por diversos e diferentes territórios[4]) e as empresas desterritorializadas.

Talvez mais acertado seria denominar a forma de atuação das corporações globais não de desterritorializada, mas sim de transterritorial ou mesmo multiterritorial, pela capacidade que estas tem de transitar por diversos territórios nacionais e intra-nacionais (assim tais empresas não seriam apenas transnacionais, pois elas atuam não apenas superando as fronteiras dos Estados-nações, mas também fronteiras de territórios internos a estes Estados).

 Referências Bibliográficas


MAGDOFF, Harry. Imperialism: From the Colonial Age to the Present. – Nova York: Monthly Review Press, 1978.
MÉSZÁROS, István. O século XXI: socialismo ou barbárie? – São Paulo: Boitempo, 2003.
MÉSZÁROS, István. Para além do capital. – São Paulo: Boitempo Editorial; Editora da UNICAMP, 2002.
WOOD, Ellen Meiksins. Democracia contra capitalismo: a renovação do materialismo histórico. – São Paulo: Boitempo Editorial, 2003.
SOUSA SANTOS, Boaventura de. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática (v.1: A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência). – 3. ed. – São Paulo: Cortez, 2001.
WALLERSTEIN, Immanuel. O fim do mundo como o concebemos: ciência social para o século XXI. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
WALLERSTEIN, Immanuel. Capitalismo histórico e civilização capitalista. – Rio de Janeiro: Contraponto, 2001.




[1] Licenciado em Geografia/UFRGS. Mestre em Geografia (Análise Ambiental e Territorial) pelo Programa de Pós-graduação em Geografia da UFRGS. – e-mail: orlando_albani@yahoo.com.br.
[2] Como os embargos econômicos ou a taxação de produtos vindos de um determinado país para, reduzindo o mercado deste, forçá-lo a abrir-se à produtos ou empresas do primeiro.
[3]O poder se mede por resultados; poder é fazer a coisa a seu modo.” (Wallerstein, 2002, p. 95)
[4] Os Estados são e devem ser, na lógica do Capitalismo, diferentes, ou seja, configurar-se como territórios, onde aspectos básicos para o Capital se diferenciem, como taxas de juros, valor da mão de obra ou preço das matérias .

hidrelétricas

Construir hidrelétricas?

 Orlando Albani

Para o pesquisador italiano Umberto Galimberti um dos problemas da atualidade (ou da modernidade) é o dissídio entre a técnica e a ética, entre o que se pode fazer (objeto da técnica) e o que se deve fazer (objeto da ética). A razão - técnica - só tem competência, conforme Galimberti, sobre o que se pode fazer; o problema está em "ver como se consegue impedir de fazer aquilo que é possível através da técnica", uma vez que, de acordo com o mesmo autor, "as técnicas exigem o seu uso". Galimberti é autor de Psiche e techne: o homem na idade da técnica (São Paulo: Paulus, 2006). Nesta obra Galimberti faz uma longa análise filosófica da técnica. O tema é importante, o que também foi salientado pelo geógrafo Milton Santos em seu livro "A natureza do espaço. Técnica e tempo, razão e emoção (São Paulo: Hucitec, 1997, v. cap.1): "O enfoque das técnicas pode tornar-se fundamental quando se trata de enfrentar essa questão escorregadia das relações entre o tempo e o espaço em geografia." Assim, sob vários aspectos, é fundamental que se pense a técnica. Na vida quotidiana atual existe certa banalização da técnica e das tecnologias de tão introduzidas que estão em nosso ambiente. Usamos as técnicas (e tecnologias) sem nenhuma reflexão a seu respeito (cf. Kosik, K. Dialética do concreto. São Paulo: Paz e Terra, 1995). Quando acionamos um interruptor de luz obviamente não pensamos na origem da eletricidade que estamos utilizando. Mas deveríamos. No caso do Brasil, cerca de 90% da eletricidade têm origem em hidrelétricas, obras que causam, como se sabe, grandes danos socioambientais, desde o desmatamento de grandes áreas de vegetação (a construção de apenas 3 usinas hidrelétricas na região amazônica, Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, com o objetivo de produzir energia para a região sul-sudeste, em especial São Paulo, deverão causar a inundação de cerca de 93 mil hectares de floresta amazônica) até os deslocamentos compulsórios das populações ribeirinhas. Apesar da discussão em torno da implantação de barragens e grandes hidrelétricas ter aumentado bastante, ainda não é suficiente. Apesar de possível, seria realmente adequado construir barragens e hidrelétricas na Amazônia? Nossa civilização, que preza tanto a razão, terá pesado todas as possibilidades? Não seriam possíveis outras técnicas de geração de energia? Não existem alternativas para uma civilização capaz de levar um homem à Lua e que almeja em breve levar um até Marte? É realmente indispensável construir hidrelétricas na Amazônia? Ou mais uma vez as técnicas - e o poder do capital e do lucro - exigiram seu uso e ponto final?

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Ser e não ser

Publico aqui um pequeno texto que julgo de grande importância. Porém devo agradecer o seu envio ao amigo Daka, colega, geógrafo e professor, que, como é próprio dos professores e amigos, nos faz lembrar de coisas importantes nas horas certas. O texto foi publicado na revista Caros Amigos e é de autoria de Emir Sader, expoente da intelectualidade brasileira:

O que é ser politizado
Emir Sader  (Revista Caros Amigos de abril de 2007)
“Ser politizado é entender como funcionam as relações de poder em cada sociedade e no mundo em geral. É compreender que, por trás das relações de troca no mercado existem relações de exploração. Que, por trás das relações de voto, existem relações de dominação. Que, por trás das relações de informação, há um processo de alienação.
 Ser politizado, no mundo de hoje, significa compreendê-lo no marco das relações capitalistas de acumulação e de exploração. Representa entender o mundo no marco da hegemonia imperial estadunidense, baseada na força militar e na propaganda do modo de vida estadunidense.
Ser politizado é compreender que tudo o que existe foi produzido historicamente, pelas relações entre os homens e o meio em que vivem. Ou melhor, entre os homens, intermediados pelo meio em que vivem. E que, portanto, tudo o que foi construído pelos homens pode ser desconstruído e reconstruído. Que tudo é histórico. Que a própria separação entre sujeito e objeto – que nos aparece como “dada” – é produzida e reproduzida cotidianamente mediante relações econômico-sociais alienadas.
Ser politizado é saber subordinar as contradições menores às estratégicas, saber que as contradições com o capitalismo são sempre também contra o imperialismo, pela fase histórica atual do capitalismo.

E o que é ser despolitizado
Já ser despolitizado é achar que as coisas são como são porque são como são, sempre foram assim e sempre serão. É considerar que as pessoas sempre buscam tirar vantagens e que não têm grandeza para lutar desinteressadamente por um mundo melhor. Que o que diferencia as pessoas é a ambição de melhorar na vida, que a grande maioria não tem jeito mesmo.
Entre o ser politizado e o despolitizado está a alienação, a falta de consciência da relação entre nós e o mundo. Alienar é entregar o que é nosso para outro – como diz a definição jurídica em relação a bens. Ser alienado é não perceber a presença do sujeito no objeto e vice-versa, sua vinculação indissolúvel.
A luta pela emancipação humana é uma luta contra toda forma de exploração, de dominação, de discriminação, mas, antes de tudo e sobretudo, uma luta contra a alienação – condição de todas as outras lutas”.

domingo, 15 de maio de 2011

Revolução Industrial

Compartilho esse pequeno (mas interessante) texto [na verdade apenas parte dele] que pode ser acessado [na íntegra] no site indicado ao final:

A Quarta Revolução Industrial
Por PAULO ROBERTO DE ALMEIDA
Doutor em Ciências Sociais, autor de vários trabalhos sobre relações internacionais e política externa do Brasil
O mundo encontra-se no limiar de uma nova revolução industrial, ou melhor, ele já está, de fato, mergulhado nela: trata-se, obviamente, da transformação radical dos processos e produtos de nossa atual civilização industrial por meio da aplicação do infinitamente pequeno às mais diferentes utilidades da vida diária. Essa revolução é bem mais importante, e mais desafiadora, do que aquelas que presidiram ao domínio do homem sobre as forças da natureza nas três revoluções anteriores ou etapas precedentes de progressos materiais e tecnológicos desta nossa civilização industrial.
Com efeito, a primeira revolução industrial, iniciada na Grã-Bretanha há pouco mais de dois séculos, assistiu à transformação da energia em força mecânica, sob a forma de caldeiras e máquinas a vapor, o que redundou, entre outros avanços materiais, no impulso dado às indústrias manufatureiras (com destaque para o setor têxtil) e aos transportes aquaviários e ferroviários.
Já na segunda revolução industrial, um século após, o destaque ficou com a eletricidade e a química, resultando em novos tipos de motores (elétricos e à explosão), em novos materiais e processos inéditos de fabricação, paralelamente ao surgimento das grandes empresas (algumas vezes organizadas em cartéis), do telégrafo sem fio e, logo mais adiante, do rádio, difundindo instantaneamente a informação pelos ares.
A terceira revolução industrial, nossa contemporânea por sua vez, mobilizou circuitos eletrônicos e, logo em seguida, os circuitos integrados, os famosos microchips, que transformaram irremediavelmente as formas de comunicação e de informação, com a explosão da internet e do comércio eletrônico e voltada crescentemente para o lazer.
A quarta revolução industrial, na qual estamos ingressando neste momento histórico, mobiliza, fundamentalmente, as ciências da vida, sob a forma da biotecnologia, bem como uma gama multidisciplinar de ciências exatas e cognitivas que responde pelo nome de nanociência. Esta, por sua vez, se confunde praticamente com suas materializações práticas, sob a forma da nanotecnologia. Desde várias décadas, senão há mais de um século, os cientistas tentam domar o infinitamente pequeno, plenamente conscientes de que é ao nível das moléculas, das partículas e dos átomos que se joga parte importante do jogo da vida e da própria composição e funcionamento do infinitamente grande, isto é, do universo. Essa busca resultou em enormes avanços científicos e materiais para a humanidade, assim como no deslanchar de forças que chegaram a ameaçar a própria sobrevivência da civilização sobre o planeta, tanto sob a forma do holocausto nuclear como na perspectiva de uma guerra biológica ou química.
Agora, quando os novos equilíbrios estratégicos e a diminuição das tensões permitida pela relativa convergência de valores e de sistemas econômico-sociais atribuem um sentido positivo às pesquisas científicas nas áreas da energia atômica, dos novos materiais, dos elementos químicos e da biologia, as possibilidades abertas pela inovação tecnológica e pela cooperação internacional nessas áreas de fronteira do conhecimento humano abrem um potencial imenso de realizações, para a humanidade em geral, e também para o Brasil.
(Nota: os grifos são do autor deste blog)
Fonte (acessível em): http://www.espacoacademico.com.br/052/52almeida.htm [15/05/2011]


terça-feira, 10 de maio de 2011

Geografia econômica


As Revoluções Industriais
por Orlando Albani

Uma série de inovações tecnológicas passam a ocorrer no século XVIII, mas 2 merecem ser destacadas: as máquinas modernas que substituíram o trabalho humano, mais rápidas e precisas e a utilização do vapor como fonte de energia para o acionamento das máquinas. Com a invenção da máquina a vapor o carvão se tornaria um mineral estratégico. Estas e outras inovações resultaram na grande transformação que foi a passagem de uma economia agrária e artesanal para outra dominada pela indústria fabril e o maquinismo, enfim, a Revolução Industrial que teve inicio na Inglaterra ao final do século XVIII (1760). Assim, desde 1760 o processo de fabricação de mercadorias já passou por 3 fases que denominamos de Primeira, Segunda e Terceira Revoluções Industriais.

PRIMEIRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (1760-1870)
A Primeira Revolução Industrial (RI) tem relação direta com o capitalismo industrial (1760-1870). É nela que surgem as fábricas com máquinas movidas a vapor (o que exigia grandes quantidades de carvão mineral, minério no qual a Inglaterra [país em que se origina a RI e o capitalismo industrial] era rica) e o trabalho assalariado. Vale observar que a lenha ainda seria muito importante, mas que gradualmente perderia destaque tanto pela maior eficiência do carvão como fonte de energia calorífica como pela escassez progressiva da madeira nas ilhas britânicas.  
Deste fato se pode salientar o enorme impacto ambiental que a Revolução causou tanto para a vegetação das ilhas como para a atmosfera. Também vale lembrar que o Reino Unido possui uma área relativamente pequena, apenas cerca de 245.000 km² (Não se considera ai os 70.000 km² da Irlanda que fez parte do Reino Unido entre 1800 e 1949), portanto menor que o território atual do Rio Grande do Sul (cerca de 282.000 km²).
As fábricas agrupavam centenas de trabalhadores ocupados na produção em série de mercadorias. Institui-se uma divisão de classes: os capitalistas (donos de todos os meios de produção e de todo o lucro [ou todo o prejuízo]) e os trabalhadores assalariados (proletários). Surge uma nova sociedade: a sociedade industrial. Da Inglaterra estas transformações se estenderam, de forma desigual, para outros países da Europa continental.
Na Inglaterra a indústria do algodão foi fundamental. 90% da produção era exportada para as colônias inglesas. A maior parte do algodão das fabricas, contudo, saía do sul dos EUA que ainda utilizavam trabalho escravo. O mercado torna-se mundial e passa a integrar e relacionar todos os continentes. Novamente a Inglaterra tem a vantagem de ser uma potência naval com uma importante frota tanto comercial como bélica.
 Com a RI ocorre uma intensa migração para as cidades industriais e intensifica-se o processo de urbanização e o crescimento populacional. A Inglaterra, a “fábrica do mundo”, muito se beneficiou das relações coloniais tanto como mercados para seus produtos industrializados como para a obtenção de matérias-primas, sem esquecer a disponibilidade de carvão mineral em seu próprio solo.
Assim, a Primeira Revolução Industrial será caracterizada pelos seguintes aspectos principais:   
(a)  adoção rápida de inovações técnicas (fiandeira e tear mecânico);
(b)  aumento da produção e barateamento do preço das mercadorias;
(c)   separação entre capital e trabalho;
(d)  modo de produção capitalista;
(e)  predominância da energia fóssil (carvão mineral);
(f)    liberalismo como doutrina econômica;
(g)  concentração da produção em centros urbanos;
(h)  surgimento de um movimento sindicalista.

Obs.: As inovações técnicas também atingiriam o campo e aumentariam a produtividade agrícola, reduzindo a importância dos trabalhadores do campo que, sem trabalho, migravam para as cidades industriais.


SEGUNDA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (1870-1970)
A primeira revolução industrial resultou em um intenso crescimento da produção mundial de mercadorias e matérias-primas. Em meados do século XIX, quando tem inicio a Segunda Revolução Industrial, a Inglaterra sofre com uma crise de superprodução. Depois, no final do século XIX, uma nova crise atinge diversos países industrializados (incluindo os EUA e a Alemanha) em função de uma queda continua e gradativa dos preços entre 1873 e 1896 (conhecida como A Grande Depressão). 
Assim, no final do século XIX, diante das crises, ocorreu um esforço para a criação de novas tecnologias que aumentassem os lucros, o que acabou ocasionando a Segunda Revolução Industrial a partir de 1870. Ocorreram avanços importantes especialmente no setor de transportes com navios e locomotivas a vapor tornando o transporte de mercadorias mais rápido. Outros avanços ocorreram, mas desta feita os países que lideraram esse processo foram a Alemanha e os Estados Unidos (EUA).
Ciência e capitalismo se unem no desenvolvimento de novas técnicas e tecnologias que aumentassem a produção e auxiliassem o processo de acumulação de capital. [1] Considera-se ter sido a Alemanha que deu inicio à incorporação da ciência aos empreendimentos capitalistas. Destacam-se os avanços em quatro campos fundamentais: eletricidade, aço e concreto armado, petróleo e química e motor a explosão. A essa última invenção associa-se o desenvolvimento da indústria automobilística, que seria fundamental nas primeiras décadas do século XX (e na qual teria origem o fordismo).
Deste modo, a Segunda Revolução Industrial pode ser caracterizada pelos seguintes aspectos principais:
(a)  Ciência e Capital (capitalistas) unem-se em prol do desenvolvimento tecnológico (voltado para a obtenção de maiores lucros);
(b)  Produção concentrada em empresas cada vez maiores com a formação de trustes, cartéis  e holdings;
(c)   Fusão do capital industrial e do capital financeiro formando sociedades, originando o chamado Capitalismo Financeiro;
(d)  Papel crescente dos Bancos (agentes financiadores da produção) e das Bolsas de Valores (os fluxos [“exportações”] internacionais de capital passam a ter grande importância, diferentemente da Primeira Revolução Industrial onde a exportação de mercadorias era o mais importante)
(e)  As grandes empresas monopolistas dos países industrializados (daí essa fase do capitalismo também ser denominada de Capitalismo Financeiro e Monopolista[2]), associadas a Estados (que lhes davam garantias econômicas e, por vezes, militares), partem, no final do século XIX, para uma divisão dos mercados e, seqüencialmente, para uma nova partilha colonial, o IMPERIALISMO, que se materializou territorialmente na Congresso de Berlim (1885) e na partilha da África, empreendimento em que Inglaterra e França levaram clara vantagem sobre a Alemanha, sendo esse um dos fatores que levaram à Primeira Guerra Mundial.
(f)    Liberalismo econômico até 1933 quando desenvolve-se o Keynesianismo (que se torna a doutrina econômica da maioria dos países desenvolvidos até a década de 1970).
(g)  A partir de 1945 (com o final da segunda Guerra Mundial) ocorre uma transnacionalização da empresas (especialmente dos EUA) com a implantação de filiais de empresas norte-americanas (estadunidenses) em países da Europa e do Terceiro Mundo.
(h)  No inicio do século XX, a sociedade do automóvel e de consumo.


TERCEIRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (1970 ATÉ OS DIAS ATUAIS) ou REVOLUÇÃO TÉCNICO-CIENTÍFICA
A Terceira Revolução Industrial (RI) está associada à globalização econômica e financeira e ocorreu marcadamente a partir da segunda metade do século XX mas especialmente a partir da década de 1970. No período entre 1945 e 1970, no seio da guerra fria (EUA x URSS), diversas tecnologias – muitas delas tendo sido criadas no âmbito da corrida armamentista e espacial entre EUA e URSS – ganharam uso civil. São muitas as inovações tecnológicas que resultaram na Terceira Revolução Industrial e na chamada globalização: inovações nos setores farmacêutico e químico; novos fertilizantes agrícolas; aviões a jato; satélites; computadores; internet; telefonia celular, entre outras. Todas elas tiveram ampla difusão por todo o planeta.
O keynesianismo (Estado de Bem-estar Social) dá lugar ao Neoliberalismo, doutrina econômica hegemônica na atualidade na maioria dos países do mundo. A partir do Japão surge um novo tipo de organização do trabalho e da produção: o toyotismo (just-in-time, “primeiro vender para depois fabricar”, reduzindo custos e diminuindo estoques), que substituiria o fordismo da Segunda Revolução Industrial.
A expansão das multinacionais e a internacionalização da produção (fragmentação da produção), ocorrida a partir de 1945, ganha novo estímulo com os grandes avanços nas áreas de transportes, comunicação e transmissão de informações, em especial com o advento da internet. A partir dos anos 1970 e 1980 a localização das unidades produtivas (fábricas e montadoras) perde importância pelas facilidades (e barateamento) dos transportes e da comunicação. Surge o mercado efetivamente mundial, globalizado, que funciona 24 horas por dia. Há grande desenvolvimento nas áreas de robótica, biotecnologia e informática. Nas grandes indústrias high-tec a robotização é a norma. Ocorre uma nova onda de fusões e incorporações de empresas. As empresas tornam-se globais, de atuação planetária. É a globalização. Deve-se notar que se por um lado o desenvolvimento de novas tecnologias torna o trabalho mais produtivo e aumenta a produtividade, por outro pode causar desigualdades, aumento da pobreza e desemprego.
Alguns países subdesenvolvidos (especialmente na América Latina e Ásia) se industrializam e assim se constitui uma nova DIT (divisão internacional do trabalho). Muitos países, no entanto, tem uma industrialização dependente tecnologicamente, o que aumenta as desigualdades internas e externas. Nesta nova fase do processo de industrialização, e do capitalismo, a localização espacial das fábricas parece por vezes irrelevante e assim sua localização ocorre em função dos menores custos de produção. É assim que, na atualidade, mesmo empresas brasileiras estão se transferindo para a Ásia (China ou Índia)  e causando desemprego no Brasil.
Deste modo, a Terceira Revolução Industrial pode ser caracterizada pelos seguintes aspectos principais:
(a)  Grande desenvolvimento tecnológico (robótica, informática);
(b)  Barateamento dos transportes e da comunicação;
(c)   Transnacionalização e fragmentação (internacionalização) da produção de mercadorias;
(d)  Mercado global; Nova DIT;
(e)  Neoliberalismo;
(f)    Toyotismo;
(g)  Capitalismo financeiro globalizado; crescimento exponencial da especulação financeira (mundialização financeira). A especulação financeira parece tornar-se mais importante que a atividade produtiva. Todas as grandes empresas destinam grande quantidade de capital à especulação nas Bolsas de Valores de todo o mundo.

Por fim, não devemos deixar de ressaltar as crises que são relativas ao período entre 1970 e os dias atuais: as crises do petróleo (1973, 1979, 2007, 2011 (barril acima dos US$ 100,00) e a crise ecológica que se arrasta desde os anos 1980. Também convém lembrar-se da “questão” China (o 3° PIB mundial em 2010), cujo crescimento assombroso desde os anos 1990 vem, interessantemente, afetando/transformando o mercado mundial. Mas esse já é um assunto para outro momento.



[1] Lembrar que o capitalismo é “um sistema econômico e social baseado na propriedade privada dos meios de produção (terras, máquinas e outros equipamento indispensável para a fabricação de mercadorias) e na organização da produção visando o lucro e empregando trabalho assalariado.
[2] Apesar dos Estados serem liberais. As empresas capitalistas são monopolistas pois é a situação mais vantajosa possível, isto é, dominar completamente um mercado. Contudo seus Estados (os países em que tais empresas têm sede) devem ser liberais e promover o “livre-comércio”, isto é,  devem trabalhar (inclusive por meio da guerra se necessário) para que empresas de outros países não obtenha monopólios.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Construir hidrelétricas?
Prof. Ms. Orlando Albani de Carvalho

Para o pesquisador italiano Umberto Galimberti um dos problemas da atualidade (ou da modernidade) é o dissídio entre a técnica e a ética, entre o que se pode fazer (objeto da técnica) e o que se deve fazer (objeto da ética). A razão - técnica - só tem competência, conforme Galimberti, sobre o que se pode fazer; o problema está em "ver como se consegue impedir de fazer aquilo que é possível através da técnica", uma vez que, de acordo com o mesmo autor, "as técnicas exigem o seu uso". Galimberti é autor de Psiche e techne: o homem na idade da técnica (São Paulo: Paulus, 2006). Nesta obra Galimberti faz uma longa análise filosófica da técnica. O tema é importante, o que também foi salientado pelo geógrafo Milton Santos em seu livro "A natureza do espaço. Técnica e tempo, razão e emoção (São Paulo: Hucitec, 1997, v. cap.1): "O enfoque das técnicas pode tornar-se fundamental quando se trata de enfrentar essa questão escorregadia das relações entre o tempo e o espaço em geografia." Assim, sob vários aspectos, é fundamental que se pense a técnica. Na vida quotidiana atual existe certa banalização da técnica e das tecnologias de tão introduzidas que estão em nosso ambiente. Usamos as técnicas (e tecnologias) sem nenhuma reflexão a seu respeito (cf. Kosik, K. Dialética do concreto. São Paulo: Paz e Terra, 1995). Quando acionamos um interruptor de luz obviamente não pensamos na origem da eletricidade que estamos utilizando. Mas deveríamos. No caso do Brasil, cerca de 90% da eletricidade têm origem em hidrelétricas, obras que causam, como se sabe, grandes danos socioambientais, desde o desmatamento de grandes áreas de vegetação (a construção de apenas 3 usinas hidrelétricas na região amazônica, Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, com o objetivo de produzir energia para a região sul-sudeste, em especial São Paulo, deverão causar a inundação de cerca de 93 mil hectares de floresta amazônica) até os deslocamentos compulsórios das populações ribeirinhas. Apesar da discussão em torno da implantação de barragens e grandes hidrelétricas ter aumentado bastante, ainda não é suficiente. Apesar de possível, seria realmente adequado construir barragens e hidrelétricas na Amazônia? Nossa civilização, que preza tanto a razão, terá pesado todas as possibilidades? Não seriam possíveis outras técnicas de geração de energia? Não existem alternativas para uma civilização capaz de levar um homem à Lua e que almeja em breve levar um até Marte? É realmente indispensável construir hidrelétricas na Amazônia? Ou mais uma vez as técnicas - e o poder do capital e do lucro - exigiram seu uso e ponto final?

Nossa única Terra

"O que você vai fazer com o que você sabe?"

Conhecer a realidade

"A primeira condição para mudar a realidade é conhecê-la" (Eduardo Galeano)

FOOTPRINT

Reproduzimos a seguir um interessante texto explicativo sobre a pegada ecológica global:

Pegada Ecológica (Footprint)

A Pegada Ecológica (footprint) calcula a pressão do ser humano sobre o planeta, medindo a rapidez com que consumimos recursos naturais e produzimos resíduos, em comparação com a capacidade do planeta de absorver esses resíduos e gerar novos recursos – denominada de biocapacidade.
Os dados mais recentes, de 2006, sobre a biocapacidade do planeta apontam para 2,1 hectares por pessoa, enquanto nosso consumo já é de 2,7 hectares por pessoa. Isso quer dizer que estamos consumindo cerca de 1,4 planeta e que a Terra precisa de 16 meses para repor o que usamos em 12. Se continuarmos com um modelo de desenvolvimento como o que temos atualmente, em 2050, quando se estima que seremos 9 bilhões de habitantes, teremos uma dívida ecológica de 24 meses, e ainda não se tem certeza se o planeta, de fato, aguentaria uma pressão deste tamanho.
Vale considerar que estamos falando apenas de uma entre as 1,4 milhões de espécies existentes. Ou seja, não adianta apenas calcular qual é a biocapacidade da Terra e o quanto podemos consumir. Há que se pensar sobre o quanto de biodiversidade estamos dispostos a conservar. Jennifer Mitchel, diretora da Global Footprint Network, diz que se trata de uma decisão sobre em que tipo de mundo queremos viver. Isso sem contar que ainda será necessário deixar recursos suficientes para as gerações futuras (princípio da sustentabilidade).
A chamada Pegada de Carbono corresponde à metade da Pegada Ecológica e é o componente que cresce mais rapidamente. E é onde podemos atuar de maneira mais intensiva para diminuir a sobrecarga sobre o planeta. Até porque, o aumento de temperatura da Terra pode diminuir ainda mais o acesso a recursos naturais.
A pegada ecológica de cada país é calculada a partir de mais de 5 mil dados reportados pelos próprios países à ONU. “É uma medida conservadora, com a sobreestimação da biocapacidade dos países e uma subestimação do consumo”, admite Jennifer Mitchel.
Hoje, os Emirados Árabes são o país que tem a maior pegada ecológica do mundo, consomem 9,6 hectares globais por pessoa. Os Estados Unidos vêem em segundo lugar, com 9,4 hectares globais por pessoa. Se todos os habitantes do planeta tivessem o mesmo estilo de vida que os americanos, seriam necessários 4,5 planetas para suprir todo o consumo.
A biocapacidade brasileira é a segunda maior do planeta – 7,3 hectares/pessoa, atrás apenas dos EUA. No entanto, a pegada ecológica do Brasil é de 2,4 hectares por pessoa. Isso quer dizer que consumimos menos do que nosso país tem capacidade de gerar, mas, em termos globais, superamos a biocapacidade do planeta que é de 2,1. A China, por outro lado, tem apenas 0,9 hectares de biocapacidade, mas consome 2,1 hectares/pessoa. Ou seja, os chineses estão na média do que o planeta pode aguentar, mas não suprem os recursos que consomem em seu próprio território.
Ao longo do tempo, um país pode conseguir reduzir sua pegada ecológica e isso não implica em prejuízos para seu desenvolvimento socioeconômico. O Brasil faz esse caminho. Em 1977, nossa pegada era de 2,8 hectares globais por pessoa e nosso IDH de 0,66. Dez anos depois, havíamos diminuído a pegada para 2,6, enquanto o IDH crescia para 0,71. Os dados de 2006 apontam uma pegada ecológica de 2,4 e um IDH de 0,8. Outro exemplo disso é a Europa, que tem um IDH tão alto quanto o dos EUA e, no entanto, metade da pegada de um americano (Ou seja: os europeus tem o mesmo padrão de vida de um estadunidense porém utilizando menos recursos naturais).
Em uma escala IDH x Pegada Ecológica, realizada pela Global Footprint Network, Cuba é o país mais sustentável do mundo, ou seja, tem um IDH alto e uma baixa Pegada Ecológica.
A ferramenta, é claro, tem suas limitações. A Pegada Ecológica só mede os recursos naturais renováveis a cada ano e que estão na superfície do planeta, não mede água e nem recursos minerais. Também não faz distinção entre uma área de floresta e outra utilizada pela agricultura. O que significa que se uma região for desmatada para o plantio de soja, por exemplo, isso não será contemplado.
Os esforços da Global Footprint Network são para que todos os seres humanos satisfaçam suas necessidades usando um planeta apenas, afinal, é exatamente isso que temos. Para tanto, além de inovação tecnológica e investimento de recursos financeiros, será necessário também mudar hábitos de consumo e reduzir o crescimento da população.
Daqui pra frente, cada vez mais, será impossível não considerar a limitação de nossos recursos naturais na tomada de qualquer decisão que envolva o consumo destes


sexta-feira, 8 de abril de 2011

Líbia

Algo está podre no chamado "Jamahiriya" da Líbia

Mahdi Darius Nazemroaya
[Especializado no Oriente Médio e Ásia Central. Ele é pesquisador associado do Centro de Investigação sobre a Globalização.]


Não há dúvida que o Coronel Muammar Al-Kadafi seja um ditador. Ele tem sido o ditador e assim chamado "Qaid" da Líbia há cerca de 42 anos. Até agora, parece que as tensões estão sendo elevadas e as chamas da revolta tornando a situação mais intensa dentro da Líbia. Por exemplo as declarações anteriores feitas pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros Britânico William Hague que o Coronel Kadafi fugira da Líbia para Venezuela.[1] Esta declaração serviu para eletrificar a revolta contra Kadafi e seu regime na Líbia.

Embora os três tenham a ditadura em comum, Kadafi na Líbia é um pouco diferente de Ben Ali na Tunísia ou Mubarak no Egito. A liderança na Líbia não é completamente servil às vontades dos Estados Unidos e a União Europeia. Diferente dos casos da Tunísia e do Egito, o relacionamento que existe entre Kadafi e ambos, EUA e União Europeia, é um modus vivendi. Simplesmente, Kadafi é um ditador árabe independente e não um "ditador gerenciado" como Ben Ali e Mubarak.

Na Tunísia e no Egito o status quo prevalece, a máquina militar e neoliberalista permanecem intactas; ela trabalha para os interesses dos EUA e União Europeia. Na Líbia, entretanto, perturba a ordem estabelecida pelos propósitos da EUA e União Europeia.

Os Estados Unidos e União Europeia agora buscam tirar proveito da revolta contra Kadafi e sua ditadura com esperanças de construir uma posição muito mais forte na Líbia que anteriormente. Armas também estão sendo levadas para Líbia pelas fronteiras do sul para promover a revolta. A desestabilização da Líbia também teria significantes implicações para o Norte da África, Oeste da África e, as reservas mundiais de energia.

Coronel Kadafi em um breve resumo

Ao subir ao poder, Kadafi começou como um capitão líbio entre um grupo de oficiais militares que realizou um golpe de estado. O golpe de 1969 foi contra a jovem monarquia do rei Idris Al-Sanusi. Sob a monarquia, a Líbia era amplamente vista como sendo condescendente para os EUA e os interesses europeus ocidentais.

Embora ele não tenha um estado oficial ou posição no governo, Kadafi tem nutrido e enraizado profundamente uma cultura política de clientelismo, corrupção e privilégio na Líbia desde o golpe de 1969. Adicionado a isso está a cortina de fundo do "culto da personalidade" que ele promove, que também é aplicada na Líbia.

Kadafi têm feito tudo para representar a si como um herói para as massas, especialmente os árabes e africanos. Suas aventuras militares em Chade foram também entrelaçados para deixar sua marca na História e criando um Estado-cliente com o desmembramento de Chade. O chamado "Livro Verde" de Kadafi tem sido vigorosamente retratado e venerado como uma grande façanha no pensamento político e filosófico. Numerosos intelectuais foram forçados ou subornados a elogiá-lo.

No passar dos anos, o Coronel Kadafi tem tentado cultivar uma romântica figura de si como um homem simples do povo. Isso inclui fingir morar em uma tenda. Ele fez tudo para destacar-se. Sua reprovação em relação aos outros ditadores árabes, como o Rei Abdullah da Arabia Saudita, nas reuniões da Liga Árabe fizeram manchetes e foram acolhidas por muitos árabes. Enquanto no estado de visitas ele deliberadamente cercou-se com uma comitiva feminina de guarda costas com a intenção de começar a virar cabeças. Além disso, ele também apresentou a si como um assim chamado líder religioso ou líder dos muçulmanos e homem de Deus, palestrando sobre o Islamismo dentro e fora da Líbia.

Líbia é dirigida por um governo sob as leis de Kadafi. Medo e nepotismo têm sido as chaves para manter a chamada "ordem" na Líbia entre os funcionários e cidadãos. Libaneses e estrangeiros foram mortos e desapareceram durante quatro décadas. O caso de Al-Sadr, Musa do Líbano, fundadora do Movimento Amal, é um dos o mais famosos destes casos e sempre foi um obstáculo para as relações Líbano-Líbia. Kadafi tem tido muito efeito negativo na criação e condicionamento de toda uma hierarquia de funcionários corruptos em Trípoli. Cada um cuida de seus próprios interesses às custas do povo líbio.

Frações e Tensões dentro da hierarquia no Regime de Kadafi

Devido a personalidade do regime de Kadaf em Trípoli há uma série de tensões internas na Líbia e na estrutura do próprio regime. Uma dessas tensões é entre Saif Al-Islam Kadafi e antigo círculo de ministros de seu pai. Os ministros líbios são geralmente divididos entre aqueles que se reúnem em volta de Saif Al-Islam e aqueles que são parte da velha guarda.

Há ainda as tensões entre Kadafi e seus filhos. Em 1999, Mutassim Al-Kadafi tentou demitir seu pai enquanto o Coronel Kadafi estava fora da Líbia. Mutassim Kadafi detém um gabinete como um conselheiro de segurança nacional da Líbia. Ele também é famosamente conhecido entre os líbios por ser um playboy que gasta muito de seu tempo na Europa e no exterior. Há também Khames Kadafi quem dirige sua própria milícia de bandidos, a qual é chamada de Milícia Khames. Ele sempre foi pensando como um possível candidato para sucessão contra seus próprios irmãos.

Sempre houve medo na Líbia sobre a questão da sucessão do Coronel Kadafi. Ao longo dos anos, Kadafi tem removido completamente da Líbia qualquer forma oposição organizada a ele ou impedido qualquer pessoa, fora de sua família, acumular poder suficiente para desafiar sua autoridade.

A questão da lealdade e deserção na Líbia

Incontestavelmente, uma pequena lealdade é sentida por Kadafi e sua família. Tem sido o medo que mantêm os líbios na linha. Ao nível do governo e o exército líbio, mantém seus funcionários pelo medo e o interesse próprio, bons e corruptos da mesma forma, em consonância. A manta do medo está agora sendo desfeita. Afirmações e declarações de denúncias contra o regime de Kadafi estão sendo ouvidos das autoridades, cidades e quartéis militares pela Líbia.

Aref Sharif, chefe da Força Aérea da Líbia, abandonou Kadafi. O ministro do Interior, Abdul Fatah Al-Yunis (Al-Younis), que é de Benghazi e supervisiona um ramo da obra de operações especiais na Líbia, demitiu-se. Dizem que Yunis é o "número dois" de Kadafi ou segundo no comando, mas isto não está certo. Abdullah Sanusi, o chefe da Inteligência Interna da Líbia e parente de Kadafi através do casamento, é o mais perto de ser o "número dois" dentro da estrutura de poder na Líbia.

Têm-se feito notícias sobre dois pilotos líbios que desertaram para Malte e navios de guerra líbios recusando-se a atacar Benghazi. Deserções são como bolas de neve entre exército e o governo. Assim, deve ser feita uma pausa para analisar a situação.

A oposição líbia

Neste ponte, entretanto, deve ser questionado quem é a "oposição" na Líbia. A oposição não é um corpo monolítico. O denominador comum é a oposição à ordem de Kadafi e sua família. Há que ser dito que "ações de oposição ou resistência contra um opressor" e um "movimento de oposição" são também duas coisas diferentes. Para a maior parte, as pessoas comuns e os funcionários corruptos da Líbia, que nutre ódio por Kadafi e sua família, estão agora no mesmo campo, mas são diferentes.

Há uma autêntica forma de oposição, que não é organizada, e uma sistemática forma de oposição, que é ou externa ou liderada por figuras de dentro do regime líbio. A autêntica oposição interna das pessoas na Líbia não é organizada e as "ações da oposição" têm sido espontâneas. Ainda assim, a oposição e a revolta tem sido encorajada e solicitada de fora da Líbia, através de redes sociais, estações internacionais de notícias e eventos no resto do mundo Árabe. [2]

A liderança da oposição interna que está emergindo na Líbia está vindo de dentro do próprio governo. Funcionários corruptos que tem se rebelado contra Kadafi não são os campeões do povo. Esta imagem da oposição não é oposta a tirania; eles são apenas opostos ao comando do Coronel Kadafi e sua família. Aref Sharif e Al-Yunis são eles próprios figuras do regime líbio.

Também tem que ser considerado que alguns oficiais líbios que se viraram contra Kadafi estão fazendo isso para salvarem a si mesmos. Enquanto outros no futuro trabalharão para conservar ou fortalecer suas posições. Abdel Monein Al-Honi, enviado líbio à Liga Árabe no Cairo, pode ser olhado como um exemplo. Al-Honi denunciou Kadafi, mas deve ser observado que ele era um dos membros do grupo de oficiais líbios que executou o golpe de Estado em 1969 com Kadafi, e que, mais tarde, em 1975, ele mesmo tentou tomar o poder em um golpe que falhou. Após o golpe falho, ele iria fugir da Líbia e retornaria somente em 1990 após Kadafi ter perdoado-o.

Al-Honi não é o único diplomata líbio a renunciar. O embaixador líbio para Índia também fez o mesmo. Há uma intenção por parte destes funcionários serem membros da estrutura de poder na Líbia, após a expulsão de Kadafi:

Ali al-Essawi, embaixador líbio para a Índia, disse à BBC que ele estava saindo, opondo-se à violenta repressão do seu governo sobre os manifestantes.

O senhor Al-Essawi foi formado para ser um ministro em Trípoli e poderia ser uma importante figura no governo alternativo, no caso do presidente líbio Muammar Kadafi caísse.

O segundo diplomata líbio a entregar o cargo foi o Representante Permanente da Liga Árabe de Trípoli, Abdel Monein Al-Honi, que disse no Cairo que ele tinha saído de seu emprego para "se juntar à revolução" em seu país.

"Eu apresentei a minha demissão, em protesto contra os atos de repressão e violência contra manifestantes, e eu estou me juntando ao grupo da revolução", disse Sr. Al-Honi. O segundo secretário Hussein Sadiq al Musrati, anunciou sua demissão da China, em uma entrevista para Al-Jazeera, e chamou o exército a intervir no levante. [3]

Novamente, esses funcionários revoltados, como Al-Yunis e Sharif, estão dentro do regime. Ele não são eles não são simples diplomatas, mas os ex-ministros. Há também a possibilidade que esse tipo de "figuras da oposição" possa ter ou fazer acordos com potências externas.

Forças externas em jogo na Líbia

Os governos dos EUA, Britânico, França, Alemanha e Itália todos sabiam muito bem que Kadafi era um tirano, mas isso não impediu nenhum deles a fazer acordos lucrativos com Trípoli. Quando a mídia cobre a violência na Líbia, eles deveriam questionar também, de onde são as armas que estão sendo usadas? A venda de armas que os EUA e a União Europeia tem feito à Líbia deveria ser examinada. Isto é uma parte dos seus programas de promoção da democracia?

Desde a reconciliação entre os EUA e Líbia, as forças militares de ambos os países tem se aproximado. A Líbia e os EUA tem tido transações militares e desde a reconciliação, Trípoli tem sido muito interessada em comprar equipamento militar norte-americano.[4] Em 2009, uma porta-voz do Pentágono, Tenente-Coronel Hibner, afirmou esta relação: "[Os EUA] irão considerar os pedidos de equipamento de defesa que permite [Líbia] a construir áreas que sirvam aos nossos interesses mútuos [ou sincronizar os interesses norte-americanos e líbios]."[5] O qualificador aqui é os interesses dos EUA, o que significa que o Pentágono somente irá armar a Líbia, com base nos interesses dos EUA.

No que parece ter acontecido durante a noite, um novo arsenal inteiro de equipamentos militares dos EUA apareceu na Líbia. Caças F-16 norte-americanos, helicópteros Apache, e veículos terrestres estão sendo usadas dentro da Líbia por Kadafi. [6] Isto é uma revelação chocante, se corroborada. Não há registros públicos sobre alguns desses equipamentos militares norte-americanos no arsenal no exército líbio. Em relação ao F-16, aviões líbios são tradicionalmente franceses Mirages e russos Mig-made.

Silvio Berlusconi e o governo italiano também tem sido fortes apoiadores do regime de Kadafi. Há informação saindo da Líbia que pilotos italianos também estão sendo usados pela Força Área líbia.[7] Mercenários do Chade, Sudão, Níger e Nigéria também estão sendo usados. Isto foi verificado através de um vídeo vindo da Líbia. O regime líbio também está considerando contratar firmas de segurança americanas ou europeias (mercenários). [8]

A política da Al Jazeera

O governo líbio desligou a internet e as linhas telefônicas e uma guerra de informação está em andamento. Apesar de ser uma das redes de notícias mais profissional do mundo, tem de ser advertido de que a Al Jazeera não é um personagem neutro. É subordinada à Emir do Catar e do governo do Catar, o qual também é uma autocracia. Pegando e escolhendo o que noticiar, a cobertura da Al Jazeera da Líbia é tendenciosa. Isto é evidente quando se estuda a cobertura da Al Jazeera do Barein, o qual foi restringido devido às relações políticas entre os líderes de Barein e Catar.

Noticias da Al Jazeera sobre os disparos dos jatos líbios nos protestantes em Trípoli e nas grandes cidades são questionáveis. [9] Anexo, os relatórios que os jatos líbios que foram atacando as pessoas nas ruas não foram verificados. Nenhuma evidência visual dos ataques do jato foi mostrado, enquanto que a confirmação visual sobre outros eventos têm saído da Líbia.

Al Jazeera não está sozinha nestas reportagens tendenciosas da sobre a Líbia. A mídia saudita também está publicando os eventos na Líbia. Asharq Al-Awsat é um dono de jornal saudita que é estritamente alinhado aos interesses dos EUA na região do Oriente Médio-Norte de África. Seu editor-chefe já está publicando editoriais glorificando a Liga Árabe pela sua decisão de suspender a Líbia por causa do uso da força por parte de Trípoli contra manifestantes líbios – porque essas medidas não foram tomadas para o Egito, Tunísia, Barein ou no Iêmen?

O papel dos interesses estrangeiros na Líbia

Kadafi e seus filhos têm governado a Líbia como um Estado privado. Eles tem desperdiçado a riqueza e os recursos naturais. Um dos filho de Kadafi é conhecido por ter pago a cantora norte americana Beyoncé Knowles 1 milhão ou mais de dólares americanos por um show privado. [10] Corporações estrangeiras também têm feito um papel nessa história.

As posições e ações das corporações estrangeiras, dos EUA e da União Europeia em relação à Líbia não podem ser ignoradas.

Questionar o papel dos governos e corporações estrangeiras na Líbia é muito importante. Os governos italianos e norte-americanos deveriam ser questionados sobre o papel que pilotos de nacionalidade italiana e armas norte-americanas recentemente compradas estão fazendo na Líbia.

É muito claro que a democracia somente é usada como um pretexto conveniente contra ditadores e governos que não se curvam e servem os interesses dos EUA e da União Europeia. Tudo o que precisa fazer é apenas olhar para a forma como Mutassim Kadafi foi recebido de braços abertos, em Washington em 21 de abril de 2009 por Hillary Clinton e a administração Obama. Em seu encontro, a Secretária Clinton disse publicamente:

Estou muito agradecida por receber Kadafi no Departamento de Estado. Nos profundamente valorizamos a relação entre Estados Unidos e Líbia. Nos temos muitas oportunidades para aprofundar e ampliar nossa cooperação e estou muito ansiosa para a construção desse relacionamento. Então Sr. Kadafi seja muito bem vido aqui. [11]

O que os Estados Unidos e a União Europeia querem fazer agora é maximizar seus ganhos na Líbia. Uma guerra civil parece ser o que Bruxelas e Washington têm em mente.

A balcanização da Líbia e ao impulso à Guerra Civil

O filho de Kadafi, Saif Al-Islam fez declarações na televisão líbia sobre como os Talibãs, organizações baseadas na fé, tomaram controle da Líbia ou pretendem fazê-lo. Nada está perto da verdade. Ele também alertou sobre a destruição e a guerra civil. Isto é parte dos esforços da família de Kadafi para se manter no poder da Líbia, mas um caminho para a guerra civil na Líbia é infundado.

Entre os membros do ranking militar, Mahdi Al-Arab, deputado chefe os militares líbios, disse ter renunciado Kadafi.[12] Al-Arab, entretanto, tem modificado sua posição dizendo que não quer ver a Líbia caminhar à uma guerra civil que permitirá intervenções e tutelas estrangeiras.[13] Isto porque Al-Arab preveniu as pessoas de sua cidade, Zawarah, para juntar-se à revolta e ir para perto de Trípoli.[14]

O caminho para a guerra civil na Líbia é alimentado por dois fatores. Um é a natureza do regime de Kadafi. O outro é um desejo externo para enfraquecer e dividir a Líbia.

Kadafi sempre trabalhou para manter os líbios divididos. Por anos houve medo que os filhos de Kadafi pudessem começar um guerra civil entre eles mesmos ou que algum outro alto escalão de oficiais pudessem tentar por todos os meios tomar o poder uma vez que Kadafi estivesse partido. A guerra civil com base na etnia, regionalismo, tribalismo não é uma grande ameaça. Tribos e regiões podem ser cooptadas ou aliadas, mas as pessoas que podem despertar para uma guerra civil são personagens do regime. As ameaças de guerra civil surgem nas rivalidades entre os funcionários do regime. No entanto, deve ser entendido que essas rivalidades estão deliberadamente sendo incentivadas a dividir a Líbia.

As chamas da revolta estão sendo ventiladas dentro da Líbia. O caos no mundo árabe tem sido visto como benéfico em muitos círculos estratégicos em Washington, Tel Aviv, Londres, e na Sede da OTAN. Se a Líbia cai em um estado de guerra civil ou se torna balcanizado, isso vai beneficiar os EUA e a União Europeia a longo prazo e terá sérias implicações geopolíticas.

Todos os Estados vizinhos no norte da África seriam desestabilizados pelos acontecimentos na Líbia. África Ocidental e África Central também seriam desestabilizadas. As fronteiras tribais correndo na Líbia e Chade se estendem em países como a Nigéria, Argélia e Sudão. O caos na Líbia também teria um efeito significativo sobre a Europa e a energia global. Já os acontecimentos na Líbia estão sendo usados para validar a unidade de controle do Círculo Polar Ártico e seus recursos energéticos[15]

Qual será o fim de Kadafi?

É muito provável que Kadafi não terá uma saída feliz do poder como Ben Ali na Tunísia e Mubarak no Egito. Encontrar refúgio para Kadafi não será fácil. No geral, Kadafi é considerado uma responsabilidade pelos outros governos. Arábia Saudita, que pode ser retratada como um refúgio para os ditadores árabes, muito provavelmente não irá dar refúgio à Kadafi. Líbia e Arábia Saudita têm más relações. Ele também é procurado para a investigação no Líbano. Geralmente, a relação de Kadafi com os líderes dos petrosheiks árabes no Golfo Pérsico é tensa e negativa. Ele não terá refúgio concedido em qualquer lugar do Golfo Pérsico.

No geral, os governos árabes também terão medo de recebê-lo. Em seus esforços para se apresentar como um defensor do povo, ele insultou muitos de seus colegas ditadores árabes. Há algo a ser dito, entretanto, quando as declarações de Kadafi em reuniões da Liga Árabe, ou sobre a Palestina e Iraque são muito mais populares ou sinceras do que o resto dos ditadores árabes.

É altamente improvável que todos os países latino-americanos, europeus, ou ex-União Soviética venham a dar-lhe refúgio. Um país na África sub-Saara é o lugar mais provável onde Kadafi podia buscar refúgio.

Suas opções são limitadas e ele está determinado a se manter no poder. A guerra civil parece estar se aproximando no horizonte. É altamente improvável que ele deixará pacificamente a Líbia e os EUA e seus aliados não têm dúvida desse cenário. Em 23 e 24 de fevereiro de 2010, ele se reuniu com os líderes das três maiores tribos da Líbia (Werfala, Tarhouna e Wershfana), para garantir o seu apoio. [16] Sua própria tribo, Kadafa é apoiadora e parece que o Madarha e tribos Awlad Slieman também estão apoiando ele. [17]

As ameaças de intervenção da OTAN e dos EUA e da União Européia: o controle sobre a Líbia

A Líbia tem estado na mira do Pentágono por anos. De acordo com Wesley Clark, general aposentado que era o comandante militar supremo da OTAN, a Líbia estava na lista das nações do Pentágono a ser invadida após o Afeganistão controlado pelo Talibã. A lista incluía o Iraque, Somália, Sudão, Líbano, Síria, e Irã por último. Nas palavras do próprio Clark:

Então eu voltei a vê-lo [um oficial militar de alta patente no Pentágono] poucas semanas depois, e por esse tempo fomos bombardeando no Afeganistão. Eu disse: "Nós ainda estamos indo para a guerra com o Iraque?" E ele disse: "Ah, é pior do que isso." Ele estendeu a mão sobre a mesa. Ele pegou um pedaço de papel. E disse: "Eu só recebi essa lá de cima" - ou seja, o secretário do gabinete da Defesa - ". hoje" E ele disse: "Este é um memorando que descreve como vamos tomar sete países em cinco anos, começando com o Iraque, e depois a Síria, Líbano, Líbia, Somália, Sudão e, finalizando, o Irã." [18]

De uma forma ou de outra todas as nações na lista acima tem sido atacadas direta ou indiretamente, e todos eles, exceto a Síria e o Irã, têm sucumbido para os EUA e seus aliados. Novamente, as únicas exceções são Irã e seu aliado, a Síria. No Líbano, os EUA tiveram ganhos parciais, mas agora está recuando com o declínio de Hariri Aliança 14 de Março.

A Líbia iniciou negociações secretas com os EUA em 2001, que se materializaram em uma aproximação formal após a queda de Bagdá pelas tropas britânicas e americanas em 2003. No entanto, os EUA e seus aliados sempre quiseram expandir sua influência sobre o setor de energia da Líbia e à riqueza da Líbia apropriadamente. Uma guerra civil fornece a melhor cobertura para isso.

Líbios devem estar cientes do pretexto da intervenção humanitária

O povo líbio deve ser sua própria guarda. É claro que os EUA e a União Europeia estão apoiando ambos os lados. Os EUA e União Europeia não são aliados do povo do mundo árabe. Sob esse aspecto, os EUA auxiliam Kadafi através de equipamentos militares, enquanto também auxiliam a "oposição". Se os chamados governos ocidentais forem sérios quanto à democracia, eles poderiam ter cortado seus laços comerciais com a Líbia, em particular no setor de energia, antes de 2011.

Ambos, Washington e o poder em Bruxelas, poderiam cooptar forças da oposição. Eles têm auxiliado Kadafi, mas eles não têm controle sobre eles ou seu regime como controlavam Ben Ali na Tunísia e Mubarak no Egito. Líbia é uma história muito diferente. Os objetivos de Washington e Bruxelas será o de reforçar seu controle sobre a Líbia, quer através da mudança de regime ou a guerra civil.

"Ações da oposição a Kadafi" são fortes, mas não há um forte "movimento de oposição" organizado. Os dois são diferentes. Também não é a democracia garantida, devido à natureza da coalizão contra Kadafi, que inclui funcionários do regime corrupto.

Fala-se agora sobre uma "intervenção humanitária " na Líbia, semelhante a na Jugoslávia e no Iraque. Uma "zona e exclusão aérea" sobre a Líbia foi mencionada, como a intervenção militar da OTAN. O objetivo por trás de tais afirmações não são humanitárias, mas se destinam a justificar a interferência estrangeira, o que poderia levar a uma invasão. Caso isso se concretizar, a Líbia se tornará um país ocupado. Seus recursos seriam saqueados e os seus espólios privatizados e controlados por corporações estrangeiras, como no Iraque.

Hoje, na Líbia e no mundo árabe os fantasmas de Omar Mukhtar e Saladino ainda estão muito vivos e ativos. Livrar-se de Kadafi e seus filhos não é a solução. Todo o sistema corrupto de governo da Líbia e da cultura da corrupção política deve ser desmantelado. Ao mesmo tempo, entretanto, a interferência estrangeira ou dominação também não deve ser permitida a enraizar-se na Líbia. Se o povo líbio está mobilizado e firme, eles podem lutar contra tais esquemas.


Mahdi Darius Nazemroaya especializado no Oriente Médio e Ásia Central. Ele é pesquisador associado do Centro de Investigação sobre a Globalização.
[Traduzido para Diário Liberdade por Pamela Penha]

O original encontra-se em: Libya: Is Washington Pushing for Civil War to Justify a US-NATO Military Intervention?

NOTAS
[1] "UK Hague: some information that Qaddafi on way to Venezuela," Reuters, 21 de Fevereiro de 2011.
[2] Um deles é levado de volta pela proliferação de pré-golpe de 1969 bandeiras líbias. Onde é que todas essas bandeiras vem?
[3] "3 Libyan Diplomats resign," The Hindu. 22 de Fevereiro de 2011.
[4] James Wolf, "U.S. eyes arms sales to Libya," Reuters. 6 de Março de 2009.
[5]Ibid.
[6] Informações de fontes na Líbia, não confirmado ainda.
[7]Ibid.
[8]Ibid.
[9]Ibid.; Eu recebi duas explicações para isso. A primeira explicação é que agentes do governo da Líbia foram divulgando informações errôneas a Al Jazeera. Isso inclui relatórios feitos à Al Jazeera que os jatos estão atacando civis nas ruas. Kadafi tem usado isso para tentar desacreditar o Al Jazeera internamente na Líbia, apontando para o povo líbio que nenhum ataque do jato ocorreu e que a Al Jazeera está transmitindo informações erradas. A segunda explicação é que a Al Jazeera está simplesmente espalhando informações erradas. Seja qual for o caso, ambas as explicações não concordam que jatos líbios atacaram manifestantes ainda.
[10] Marine Hyde, "Beyoncé and the $2m gig for Colonel Gaddafi's son," The Guardian (Reino Unido). 8 de janeiro de 2010; foi para Mutassim e não Hannibal Kadafi que o concerto de música era (o artigo está errado). O artigo não é autorizado e tem sido citado para ilustrar que esses tipos de aventuras são ainda vagamente conhecido pela imprensa da Grã-Bretanha e da Europa Ocidental.
[11] Departamento de Estado dos EUA, "Remarks With Libyan National Security Adviser Dr. Mutassim Qadhafi Before Their Meeting". 21 de abril de 2009.
[12] Informações de fontes na Líbia, não confirmado ainda.
[13] Ibid.
[14] Ibid.
[15] David Ljunggren, "Libya turmoil puts focus on Arctic oil: Greenland," ed. Robert Wilson, Reuters, 23 de Fevereiro de 2011.
[16] Informações de fontes na Líbia, não confirmado ainda. Foi-me dito que Kadafi prometeu reforma à tribos e que ele iria fazê-la em cerca de um ano. Também fui informado que ele afirmou que nenhum de seus filhos passariam a controlar a Líbia quer.
[17] Ibid.
[18] General (aposentado) Wesley Clark, "92 Street Y Exclusive Live Interview," entrevistado por Amy Goodman, Democracy Now, 2 de Março de 2007.

Global Research Articles by Mahdi Darius Nazemroaya

Fonte:[Conforme publicado em:]