quarta-feira, 12 de agosto de 2009

"(...) O mercado mundial pode muito bem funcionar com 850 milhões de consumidores, como indica o consultor de empresas multinacionais Kemiche Omahe." [v. Porto-Gonçalves, C.W. IN: SANTOS, Milton et al. Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. - Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. 3.ed. (p.387).
E o resto... faz o quê?

Capitalismo, inclusão e exclusão

Outro dia, em uma conversa informal, alguém disse que "o capitalismo havia incluído muita gente que, sem ele, ainda estariam na miséria ou na escravidão" e que não seria correto colocar a culpa de tudo - na verdade ele falou em algo como "competência para a auto-inclusão" - no capitalismo. Fui forçado a concordar com meu amigo. E descordar também. Sua análise estava certa, porém apenas parcialmente certa. Faltou-lhe a dialética, a analise das contradições que envolvem o capitalismo. Certamente que o capitalismo inseriu muita gente - e enriqueceu outros tantos, não muitos, bem se sabe - e que, de fato, melhorou o estado geral de boa parte da população. Contudo esta melhoria do estado geral deu-se muito mais em algumas regiões - as que industrializaram-se primeiro, a Europa, os EUA... - do que em outras. Mas, principalmente, se o capitalismo incluiu por um lado - que talvez nem sejam tantos -, por outro ele também causou e causa o empobrecimento de um número crescente de pessoas. O desemprego estrutural - o desemprego permanente - cresce constantemente, excluíndo pessoas que apesar de competentes, são quantitativamente desnecessárias ao capitalismo. O capitalismo vive da desigualdade. A começar pelo consumo. Os EUA consomem 25% dos recursos energéticos mundiais e apenas 20% da população mundial (EUA+Canadá+Europa Ocidental+Japão) consomem 80% (oitenta!) dos recursos naturais do planeta. O capitalismo, de fato incluiu-os todos. Mas a qual custo? É essa a crítica que fazemos ao capitalismo: trata-se de um sistema em que somente os cínicos podem afirmar tratar-se de um sistema includente. De que adianta incluir se milhões são excluídos sem a menor chance de reinclusão. Esse, tristemente, é o capitalismo que temos diante de nós. E o capitalismo que não queremos.

sábado, 25 de julho de 2009

Novamente a ética e a técnica

Em que lugar colocamos a ética? Embaixo do tapete? Toda técnica, hoje, deriva, de algum modo, da ciência. As tecnologias são desdobramentos de produções científicas. Muitas vezes de uma produção paga por atores capitalistas que desejam uma nova técnica que maximize seus lucros ou que reduza a concorrência. Então vamos novamente para o nosso mantra: a ética deve intermediar o caminho do que é possível cientificamente para o que é possível tecnicamente. Ou seja: antes de um conhecimento tornar-se uma técnica, deve passar pelo crivo da ética. É como já disse (que disseram) aqui: "Se a ciência trata do que é [possível fazer], a ética tem por objeto o que deve ser [feito]" (ver: Ética econõmica e social. Arnsperger & Van Parijs. - SP: Loyola, 2003). Vamos colocar cada coisa no seu lugar.

"A geografia não é uma ciência exata"

Li ou ouvi, só não sei mais dizer onde ou quando, que "a Geografia não é uma ciência exata". Claro que a geografia é uma ciência humana. Humana e física ao mesmo tempo. O humano e o físico são uma coisa só (sem nenhum determinismo). Não preciso repetir que história e espaço caminham juntos, porque muitos já o disseram. Mas a frase é de uma simplicidade fantástica e que vale ser lembrada, principalmente para aqueles que, como eu, teimam em colocar o humano na frente do físico.

A água que nos une é mesma que nos separa

Leio, por acaso, em Bachelard [A água e os sonhos. SP: Martins Fontes, 2002.] que "(...) a água ... ela une e desune...". Curioso, pois Milton Santos diz algo muito parecido, "o espaço que nos une é o mesmo que nos separa". Santos não escreveu exatamente assim, mas foi o que ele quiz fazer entender. O espaço une e desune. No caso da construção de barragens no Brasil, de fato, a água (dos rios) que unia as comunidades, acabou por ser o mesmo elemento que levou à sua separação (desterritorialização).

sábado, 27 de junho de 2009

"As técnicas exigem seu uso" e quem paga a conta é a floresta.

Para Umberto Galimberti, um dos problemas da atualidade (ou da modernidade) é o díssidio entre a técnica e a ética, entre o que se pode fazer (objeto da técnica) e o que se deve fazer (objeto da ética). A razão - técnica - só tem competência, diz Galimberti, sobre o que se pode fazer; o problema está em "ver como se consegue impedir de fazer aquilo que é possível através da técnica", uma vez que, de acordo com o mesmo autor, "as técnicas exigem o seu uso". Galimberti é um intelectual italiano, autor de Psiche e techne: o homem na idade da técnica. [tradução: José Maria de Almeida] – São Paulo: Paulus, 2006. Nesta obra Galimberti faz uma longa análise filosófica da técnica. O tema é importante, o que também foi salientado pelo geógrafo Milton Santos em seu livro "A natureza do espaço. Técnica e tempo, razão e emoção (São Paulo: Hucitec, 1997, v. cap.1): "O enfoque das técnicas pode tornar-se fundamental quando se trata de enfrentar essa questão escorregadia das relações entre o tempo e o espaço em geografia." Assim, sob vários aspectos, é fundamental que se pense a técnica. Na vida quotidiana atual existe uma certa banalização da técnica e das tecnologias de tão introduzidas que estão em nosso ambiente. Usamos as técnicas sem nenhuma reflexão a seu respeito (v. Kosik, K. Dialética do concreto. São Paulo: Paz e Terra, 1995). Quando acionamos o interruptor de luz da sala - especialmente no Brasil - obviamente não pensamos na origem da eletricidade que estamos utilizando. No caso do Brasil, cerca de 90% dela origina-se em hidrelétricas, obras que causam, como se sabe, grandes danos socioambientais, desde o desmatamento de grandes áreas de vegetação (a construção de apenas 3 usinas hidrelétricas na região amazônica, Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, com o objetivo de suprir de energia a região sul-sudeste, em especial São Paulo, deverão requerer a inundação de cerca de 93 mil hectares de floresta) até os deslocamentos compulsórios das populações ribeirinhas. Apesar da discussão em torno da implantação de barragens e grandes hidrelétricaas ter aumentado bastante, ainda não é suficiente. Não seriam possíveis outras técnicas de geração de energia? Apesar de possível, seria realmente adequado construir barragens e hidrelétricas na Amazônia? Nossa civilização, que preza tanto a razão, terá pesado todas as possibilidades? Ou mais uma vez as técnicas - e o poder do capital - exigiram seu uso e ponto final? [OA2009]

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Se é geografia e se é crítica, então é Milton Santos. Assim vale lembrar o professor: "O espaço que, para o processo produtivo, une os homens, é o espaço que, por esse mesmo processo produtivo, os separa." (M. Santos, PENSANDO O ESPAÇO DO HOMEM. Edusp, 2004, p.33). Daí alguém já ter dito, poeticamente, que o espaço que nos une é o mesmo que nos separa. [OA, 2009]

Outra do prof. Milton Santos, para não esquecer: " [...] a principal forma de relação entre o homem e a natureza, ou melhor, entre o homem e o meio, é dada pela técnica. (...) As técnicas são um conjunto de meios (...) com os quais o homem (...) cria ESPAÇO. (v. A natureza do espaço. Hucitec, 1997, p.25)

Dominar a natureza

"O que os homens querem aprender da natureza é como empregá-la para dominar completamente a ela e aos homens. Nada mais importa." (v. Dialética do esclarecimento. Adorno & Horkheimer, 1985 [1947], p.18) Será?

Técnica e ética

A ética desvinculou-se da técnica. Aliás, bem mais correto, a técnica separou-se da ética. É pela ética que decidimos se devemos ou não realizar uma técnica. Não é papel nem da ciência, nem da técnica resolver tal questão. A ciência e a técnica são da ordem do fazer. É no campo da ética que se deve refletir sobre as razões para fazer ou não fazer alguma coisa. Assim, a solução dos problemas do presente não serão encontrados nem na ciência, nem na técnica, porque estas são totalitárias e hegemonizadas pelo poder oligopólico. A solução está na ética, na ética acima da ciência e da tecnologia. Vivemos a "idade da técnica" (v. U.Galimberti), separados da ética. Precisamos repensar nossas relações com a natureza e, sem dúvida, nossas próprias relações humanas. Os jornais noticiam que já são mais de 1 bilhão os desnutridos ou subnutridos do mundo, a maioria na África e na Ásia. Longe de nós? Nem tanto. A globalização não fez o mundo parecer menor? A África é aqui e a Ásia também. Não há falta de alimentos no mundo ou da possibilidade de produzi-los em quantidades suficientes para o dobro da população mundial. Mas sobra ganancia. Não se produz comida, somente commodities. "A gente não quer só comida", a gente quer um pouquinho de ética também ou, para ser bem sincero, um pouco de vergonha na cara. Estamos, novamente, a esperar que alguma nova técnica ou tecnologia venha para resolver os problemas ambientais, o aquecimento global, a fome... Estamos procurando no lugar errado, de novo. Não é a ciência e nem a tecnologia que vai resolver nossos tantos problemas.

domingo, 21 de junho de 2009

Outras, ainda, sobre a Técnica

"As técnicas são um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem [...] cria espaço." [M.Santos. A natureza do espaço (1997, p.25)]

"O sentido da técnica é a liberdade diante da natureza." [K. Jaspers, 1985 (1951), p.137]

"[...] Técnica é o procedimento com o qual o homem científico domina a natureza (...) a fim de dar ao seu em torno a forma que lhe pareça adequada." [K. Jaspers, 1985(1951), p.133]

' Técnica significa eficiência, velocidade, previsibilidade, controle, repetibilidade, enfim, o máximo de certeza na ação. Mas, acima de tudo, dominar as técnicas, constitui um poder. ' [OA2009]

sábado, 20 de junho de 2009

Técnica e espaço geográfico

As técnicas são um conjunto (sistema) de meios e procedimentos (ações) pelos quais o homem objetiva desvincular-se da aleatoriedade da natureza. Assim, os objetivos da técnica são controlar e regular a natureza, o tempo e o espaço, produzindo uma segunda natureza, que poderíamos chamar de espaço geográfico. (OA2009)

Será que nada é realmente im-possível?

Não devemos deixar de tentar realizar o impossível. Mas devemos pensar bem sobre tudo o que é possível de ser realizado. Quero, posso, mas.. devo fazer tudo o que é possível? Ah! Quantas coisas im-possíveis foram feitas. O que tinham na cabeça os homens que criaram as armas atômicas?

E por falar nisso...

Algumas frases soltas...

"As palavras não são inocentes" (A. Gorz)

"A verdadeira natureza do homem é não ter nenhuma" (D-R. Dufour)

"A técnica não é mais objeto de nossas escolhas" (U. Galimberti)

" As técnicas exigem o seu uso" (U. Galimberti)

O homem e a técnica

As técnicas e as tecnologias desenvolvidas pelo homem sempre objetivaram - em primeiro lugar - a adequação da natureza às necessidades humanas. Assim, o olhar técnico sempre se voltou para a natureza exterior, fora do homem. Hoje, no século XXI, a humanidade atingiu a possibilidade de não apenas transformar a natureza exterior a ela, mas o próprio corpo físico homem. Depois de ter criado uma segunda natureza por meio de uma série de artificializações do espaço, chegou a hora do homem artificial, do homem-máquina. Freud, a muito tempo, não nos deixa esquecer que jamais dominaremos completamente a natureza (sem dúvida uma frustração). A economia globalizada, baseada na utilização maciça de energia fóssil - nestes tempos de aquecimento global e mudanças climáticas - comprova que a natureza, de fato, não é coisa que se possa dominar.